09. O sapo no fundo do poço
Apesar do irmão mais novo ter lhe revelado que sabia sobre seu caso com o cachorro vadio, eles não tocaram mais no assunto.
Nesse ponto, Ling Shan havia mandado o irmão com um de seus seguranças para o hotel, reservando outro quarto no mesmo andar. Seria difícil sair do hospital com muita gente. Pelo tamanho da colmeia lá fora e escondidos entre pacientes, seria complicado e não queria expor Ling Ai a essa bagunça.
E, exceto por essa criança, não havia recebido sequer mais uma visita, nem por cortesia. E, embora soubesse a verdade, a surpresa ainda era presente: sua suposta família sequer havia perguntado pelo seu primogênito.
Ling Shan sentia pena do original. Ele poderia ter tudo o que quisesse com apenas um estalar de dedos, mas era tão vazio e solitário que nem mesmo o dinheiro poderia suprir essa necessidade.
Bem, ao menos, ele era rico. (Risos)
Na saída, durante a noite, quem o acompanhou foi apenas Donnah. O pequeno agente laranja havia sumido por esses dias, assim como seu renomado empresário. De alguma forma, ele achava que esses dois poderiam estar num motel barato fodendo.
— Não deixe nada para trás. Será difícil sair esses dias do hotel sem burburinho e buscar algo. — Donnah o alertou. — A imprensa está pressionando por todos lados…
O motorista, o senhor Kin, o aguardava numa entrada privada. Ao longe, avistou a figura robusta e de meia idade.
Um homem sério que possivelmente passou por muitas situações ruins com o cantor fajuto. Ele usava um terno preto, um par de luvas e botas sociais. Por ser alto tudo lhe caía muito bem e isso o dava uma presença muito elegante, marcada pela seriedade e foco. Mas, tinha o cabelo castanho em comprimento médio, puxado para trás e amarrado num coque, o que quebrava um pouco a sua postura. Se olhasse bem, tirando a barba curta e bem aparada, senhor Kin parecia um viking.
Um homem muito atraente e charmoso.
Mas, tinha um grande problema. Uma silhueta conhecida estava presente no banco de trás do carro.
— Boa noite, senhor Kin. — Ele se aproximou, colocou a mão sobre o ombro do motorista e falou baixinho para ele. — Da próxima vez, não é preciso buscar o lixo. Deixe-o esperar, ele ganha um ótimo salário todos os meses. Tenho certeza que consegue pegar um táxi.
— Boa noite. — Kin direcionou seu olhar para baixo, encontrando o de Ling Shan. — Terei isso em mente, chefe.
Atrás deles, a assistente estava tentando se manter séria. Se ela tinha escutado, o lixo dentro do carro também havia. Ela pensou que a viagem seria longa e agitada.
Kin abriu a porta de trás do carro e Ling Shan entrou. De imediato, um olhar frio, tão gelado quanto o ártico recaiu sobre ele. Evitando e tornando-o um com o ar, Cheng Yin foi definitivamente ignorado.
Na frente, Donnah entrou em silêncio, seguida pelo Kin.
— Lixo? — Cheng Yin perguntou com raiva.
A atmosfera dentro do carro ficou tensa.
— Ling Shan, por acaso perdeu o juízo? — O louro esfregou as têmporas. — Você não está falando com alguns de seus amantes de merda!
— Tenho certeza que não vai gostar da resposta. — Ele inclinou o tronco para mais perto do banco da frente e perguntou a sua assistente. — Sabe aquele cartão que me deu outro dia? Eu o devolvi para você guardar, tire-o para mim quando chegar no hotel.
— Não vamos para o hotel.
— Não vamos? — Ling Shan questionou.
— O sogro quer vê-lo.
— Então, ele lembra que tem um filho… — Riu áspero. — Talvez eles não tenham entendido, o único motivo para que eu pudesse voltar aquela casa é para buscar Ai’er. E agora, ele também está comigo.
— O sogro está doente. — Cheng Yin falou.
Ling Shan estreitou os olhos.
— Também estive passando por momentos ruins e não recebi nem uma mensagem perguntando se eu estava bem, em todos esses anos. Apenas a corna da sua mulher que me manda mensagens pedindo para devolver o marido.
— Não fale assim de Ling Mei, ela ainda é sua irmã.
— Não brinque… — Ironizou.
O cantor revirou os olhos. Estava cansado dessa pessoa.
— Dê-me o cartão Donnah. — Ele estendeu a mão e rapidamente o cartão estava ali. Zhuo Entertainment. — Senhor Kin, deixe-me na próxima esquina.
O motorista olhou pelo retrovisor.
— O que está fazendo? — O cão vadio perguntou. — Falo sério quando o sogro está doente. Já faz duas semanas que ele está acamado.
— Fique quieto ou serei capaz de fazer um escândalo tão grande que não será possível você comprar ninguém para limpar meu nome. — Ameaçou. — Além disso, Donnah, Sr. Kin… — Colocou uma máscara no rosto e um boné.
— Sim, chefe. — Ambos falaram.
— Me chamem de Ling Shan. — Ele falou e saiu batendo porta.
Centro da cidade H. O local mais movimentado de toda a cidade. Ling Shan colocou os óculos escuros e andou no meio da multidão. Estar sozinho era ótimo!
Não muito distante dali, num prédio comercial, um homem entrou apressado na sala do presidente.
— Yang Ge, qual o seu problema? Como não pôde cobrar os juros da quebra de contrato com a empresa LS? É um prejuízo enorme para nós!
Este homem era Zhuo Fan, irmão mais novo de Zhuo Yang e vice presidente da empresa. Ele era a pessoa responsável por intermediar o chefe com o restante dos funcionários e acionistas.
Zhuo Fan é seis anos mais novo que o irmão e, embora sejam de mães diferentes, o relacionamento entre os irmãos era tão bom que era invejável. E também por isso, eles eram bastante diferentes em aparência.
O mais novo, tinha belos cachos amarronzados e brilhantes na cabeça, olhos castanhos e lábios finos. O corpo era como de um modelo, muito bem estruturado, músculos em quantidade, volume e lugares certos. Alto e magro, muito atraente aos olhos.
E muito diferente do irmão mais velho, Zhuo Fan era alguém alegre e sociável, gentil e cavalheiro. Também uma pessoa com uma paciência invejável. Zhuo Yang era uma pessoa extremamente difícil de lidar.
E, falando no irmão mais velho, ele parou de dedilhar as teclas do piano, tirando o headset do ouvido. Pegou o copo de café amargo acima do piano e puxou o conteúdo do copo para a boca através do canudo.
Cada parte de seu suéter roçou a pele, diminuindo o comprimento no pulso, revelando um relógio prateado que custava meia década de salário de um trabalhador comum. A barra da calça também levantada mostrava um pouco da canela e tornozelos. O par de meias que Zhuo Yang usava eram especialmente peculiares.
Anjos saltitavam em meio às nuvens na meia de algodão de cano longo.
Através de um olhar de soslaio, ele decidiu responder o irmão.
— Confie em mim, essa multa não será nada em comparação ao que poderemos receber do próprio mais tarde. — Ele fechou a tampa do piano e se levantou, espreguiçando o corpo. — A-Fan, acho que teremos muita diversão daqui para frente.
Ele pôs a cabeça sobre o piano, alguns fios de cabelo penderam sobre seu rosto trazendo alguma escuridão e mistério, mas ele parecia animado.
— O que diabos está dizendo?
— O sapo no fundo do poço receberá ajuda de um deus e verá o mundo por si próprio. — Ele sorriu travesso.
Zhuo Fan jogou a pasta que segurava na mesa e sentou-se na poltrona próxima ao piano.
— E esse ‘deus’ é você?
Zhuo Fan havia passado tempo suficiente com o irmão para entender algumas das coisas estranhas e metáforas que ele usava.
— Quem mais seria?
Ele também entendia o quão narcisista esse irmão poderia ser.
— Ge se coloca muito alto. — O mais novo comentou.
Zhuo Yang olhou-o arrogante e ignorou o comentário.
— Vamos poder encostar no pastor de ovelhas que escondia o sapo e esmagá-lo com as mãos nuas. — O mais velho olhou para a mão e a fechou em um punho. — Não será divertido?
A expressão de Zhuo Yang era sombria o suficiente para assustar Zhuo Fan. Ele nunca tinha visto essa expressão do irmão!
— Talvez… — Riu mecanicamente.
— Peça a minha secretária que separe alguns currículos de alguns seguranças, setor de limpeza e alguns agentes de celebridades também. Não têm problema em serem novatos. — Ele caminhou até a mesa e colocou o copo de café sobre ela e pescou a pasta. — O que é isso?
— Os documentos com as provas daquele escândalo envolvendo a Mary Sue. — Zhuo Fan respondeu. — Os currículos… posso saber o motivo?
— Detesto o nome artístico dessa atriz! É repugnante! Como se ela fosse uma “Mary Sue” de verdade! — Ele abriu o dossiê, já encontrando várias fotos dela com velhos diretores e pessoas influentes no ramo artístico. — Por quantas portas dos fundos ela entrou?
— Ela não teve concorrência em nenhum dos papéis que pegou. — O mais novo respondeu. — Os currículos? — Perguntou novamente.
— Mary Sue aprecia muito sofás. — Ele ficou pensativo por um instante e ligou a secretária eletrônica. — Senhorita Ning compre um sofá e mande para o apartamento de nossa amada, Mary Sue. Diga que é uma cortesia do chefe dela, para recompensar o trabalho duro. Não seja mesquinha, pegue o mais luxuoso. — Ele desligou rapidamente.
— Se passar mais algumas páginas, vai gostar do conteúdo. — Zhuo Fan avisou.
Assim como sugeriu o irmão, Zhuo Yang passou algumas páginas do dossiê e teve uma surpresa. Num beco de um motel barato, Mary Sue estava seminua, prensada contra a parede e um homem na casa dos trinta anos, segurava-a pelas pernas enquanto enfiava sua ‘coisa’ dentro dela.
Outro compilado de fotos com a mesma pessoa, uma no estacionamento de um condomínio no banco da frente de um carro. Outra num parque, durante a luz do dia, ajoelhada em frente ao homem. E a que Zhuo Yang mais gostou: traindo a esposa no dia do casamento.
— Conseguimos também os depoimentos e relatórios das clínicas de aborto que ela passou durante os dois últimos anos. Não só ela, como também o pastor de ovelhas estaria em apuros. — Zhuo Fan pontuou. — Os outros diretores, não conseguimos muito porque Mary sempre estava atenta com os peidos velhos, mas com o nosso pastor, ela não se importava. Ela dizia que era infértil para ele.
— Isso é revigorante. — Riu com maldade.
— Além disso, há algo mais interessante. — Zhuo Fan se levantou ao acender um cigarro. — Mary deu à luz a uma criança há quatro anos. Na mesma época que a foto do estacionamento. Ela ficou desaparecida por um ano. Não posso provar isso por enquanto, mas…
— A família Ling não deixaria isso para lá. — O mais velho completou.
Zhuo Fan deu uma baforada e caminhou até a janela.
— Ling Mei está grávida. — Zhuo Fan comentou.
O terno cinza que usava, combinava exatamente com ele.
— O filho não é meu nem seu, porque diz isso?
— Podemos não nos mexer, por hora, até que a gravidez dela esteja estabilizada? — Zhuo Fan perguntou.
O mais velho revirou os olhos.
— Não vai depender de mim mais, irmãozinho. Nosso sapo precisa dar o salto primeiro. — Ele fechou o dossiê e aproximou-se do irmão. — Ling Mei nunca vai gostar de você A-Fan. Já deveria saber disso.
— Sei que ela não gosta de homens como eu, mas como Cheng Yin e você, irmão. — Zhuo Fan o encarou com dentes cerrados.
— Ainda chateado com isso? Já se passou cinco anos, além disso eu não sabia que você…
— Sem desculpas. — Ele deu outra baforada, soprando-a contra o vidro. — Não vou deixar minhas razões egoístas atrapalharem.
O celular de Zhuo Yang vibrou sobre a mesa.
A raposa astuta sorriu maligno quando notou o nome no visor.
— Está aqui, a peça que nos faltava Fan. — Ele pegou o aparelho e mostrou para o irmão.
Ling Shan.
— Você tem certeza disso? — O mais novo queria confirmar as ações do seu irmão mais velho. Afinal, era o Ling Shan.
— Vou ter duas coisas que quero com isso. Só tenho a ganhar. — Ele sorriu e sentou na borda da mesa com o telefone no ouvido. — É bom ouvir sua voz, cantor maluco.
∟Senhor Bonitão! — Cumprimentou igualmente. — Gostaria de agradecê-lo pela noite no festival.
— Não é preciso agradecer. Fiquei muito preocupado quando o vi desmaiado. Qualquer um em minha situação, faria o mesmo.
∟Ainda assim, gostaria de agradecê-lo… Gostaria de levá-lo para uma refeição. Estaria livre agora?
Zhuo Yang levantou as sobrancelhas, levemente surpreso. Não era algo que estava esperando.
— Claro. — Ele tampou o microfone. — Não tenho nenhum compromisso, certo?
O mais novo fez uma careta.
— Não sou sua secretária… — Zhuo Fan fez uma breve pausa. — Uma reunião casual com o Chefe Song.
— Desmarque. — Ele destapou o microfone. — Onde o Sr. Ling gostaria de me levar?
∟Estou perto da sua empresa. Que tal nos encontrarmos na entrada do parque?
— É mesmo? — Zhuo Yang sorriu naturalmente. — Chego em vinte minutos.
A ligação durou mais alguns segundos antes de Ling Shan desligar.
— O que foi tudo isso? — Zhuo Fan estava com medo do comportamento dócil do irmão.
— Disse que daqui para frente, as coisas estariam divertidas! — Respondeu como se fosse a coisa mais óbvia.
— Ling Shan e… você? Sério? — Sua expressão era de nojo. — Já teve dias melhores irmão.
— O quê? — Perguntou confuso. — Ele sempre foi um cara bonito, um pouco esquisito e desviado, mas muito bonito. — Colocou a mão no queixo, pensativo. — As abelhas e as vespas sugam as mesmas flores, mas não sabem encontrar nelas o mesmo alimento. Além disso…
Ele colocou a mão no queixo, pensativo e fez uma pequena pausa.
— Para mim, não importa tanto a aparência de alguém. — Seu sorriso torceu na malícia. — Enquanto tiver um buraco para foder, até mesmo um eunuco seria pego em minhas mãos.
— Maluco pervertido!
— Muitos dizem isso. — Riu. — Mas, A-Fan…
— Sim?
— Não fume em meu escritório. — Falou sério.
— Qual o problema? — Respondeu confuso. — Você também não fuma aqui dentro? Não faz sentido isso!
Zhuo Yang se aproximou do irmão mais novo e o encarou.
— Eu não fumo esse cigarro barato. — Ele chutou a perna do irmão e voltou ao seu lugar, como se nada tivesse acontecido.
Zhuo Fan olhou para seu Dunhill atordoado. Seu irmão queria que ele fumasse um Insígnia todos os dias? Além disso, ele gostava do sabor mentolado que essa marca proporcionava.
Seu irmão era muito chato!