12. Fui pego num kabedon
Embora precisasse ficar um mês em repouso, isso não queria dizer que Ling Shan passaria esses dias como um desempregado. Havia muitas coisas que precisava fazer. Por exemplo, Ling Shan acordou cedo, dois dias antes de seu aniversário, de mal humor: gravação final de Supernova, que teria Zhuo Xia como participação especial.
Ling Shan não conseguia entender como a LS e a Zhuo Entertainment uniram-se para a realização desse novo álbum dele. Ainda mais tendo uma participação direta da família Zhuo, com Zhuo Xia sendo a irmã mais nova de Yang Ge.
Bem, antes disso, na noite anterior, Ling Shan teve mais problemas com paparazzis e alguns fãs. Alguns, poderiam ser considerados até mesmo sasaengs, como aquele que invadiu o quarto de hotel.
Mas como havia combinado com sua assistente, retornou em paz para o quarto de hotel. O apartamento que havia comprado, precisava de alguns dias para ser liberado, além da espera para a chegada dos móveis novos.
Ling Shan abriu novamente as redes sociais. Havias fãs muito estressados por ainda não ter um esclarecimento oficial da sua parte sobre o problema com a abstinência de drogas.
Dito isso, ele estava fumando um maço de cigarro desde então. Mesmo com os medicamentos, estava sendo exaustivo controlar seus impulsos. Mas, em breve, também precisaria parar com o cigarro. Ele era um cantor e precisava de sua voz em sua melhor performance.
De certa forma, era um segredo aberto que Ling Shan tornou-se um viciado em drogas. Embora ele nunca tenha falhado ao vivo, o comportamento volátil e sumiços repentinos eram sinais de que algo estava errado.
Para aqueles mais próximos e do círculo musical, as fofocas corriam como notícias de desastre. Mas, era mais comum do que as pessoas apontavam.
Celebridades ao redor do mundo usam o que podem para suportar a pressão vinda de todos os lados. Sejam drogas, álcool ou até mesmo sexo, precisavam de um ponto de escape quando o vento cortava contra eles. Ainda mais quando estavam sozinhos.
Ling Shan não julgava o original, ele sentia pena. Mas, esse era um caminho tortuoso de retorno longínquo. Ao olhar para suas mãos trêmulas, frequentemente ele sentia aquela vontade absurda em desfazer o retorno e somente deixar-se submergir nessa escuridão. Assim, ele verificou suas redes sociais somente para sentir o ódio sendo destilado.
Ainda que soubesse o quão cruel o público poderia ser, se assustou com a campanha “anti Ling Shan” nos tópicos quentes do Teibo. Assemelhava-se muito com um requerimento ou petição reunia milhares de assinaturas online, seguidos de alguns comentários um pouco agradáveis.
Seguindo a publicação original de uma coluna de fofoca, milhares de comentários seguiam a mesma intensidade do dono do post. Eram tantos comentários negativos que se ele fosse uma pessoa de coração fraco, provavelmente, cortaria seus pulsos e tiraria sua vida.
— É por isso que muitas celebridades se perdem… — Ele suspirou alto.
De certa forma era até um pouco divertido. Como se ele ou o original ligassem para o que os outros pensassem.
Mas, vez ou outra, quando encontrava algum resquício de apoio, ele sorria. Bastava uma única luz em meio todo o ódio.
Ele jogou o celular de lado e pescou a guitarra no canto da sala. Desde que viera a este mundo, ainda não havia pego o ritmo do original. Ele precisava focar em sua carreira, antes de qualquer outra coisa. Uma oportunidade de ouro, só aparece uma vez na vida.
O modelo era uma clássica Fender American Ultra, de cor preta e personalizada com adesivos vinílicos de chibis[1] dele mesmo, feitos por fãs e arco íris, além de inúmeras bandeiras do movimento lgbt.
Ling Shan, apesar de nunca ter assumido publicamente, era um defensor atuante em causas de minorias sociais, patrocinando ONG’s anonimamente.
Os fios de nylon eram da melhor qualidade, mas não tinha uma palheta. Sempre pegava uma de seus fãs na primeira fila para começar sua apresentação. Mas, por precaução, na parte de trás da guitarra, havia um compartimento com um par de palhetas.
Ling Shan passou um bom tempo praticando, usando seu ocioso tempo para se entregar a música, aquilo que sempre sonhou. E pensou que não podia ficar parado.
Enquanto esperava por respostas sobre Cheng Yin, precisava de fazer outra coisa.
— Certo!…
“Eu preciso trabalhar.”
Então ele parou um pouco e pensou no que poderia fazer. Olhou para o teto branco e vazio. Esse corpo frágil parecia tão cansado ou poderia ser o efeito dos remédios, ele não saberia dizer.
E mais uma vez, ele fechou os olhos e permitiu-se relaxar.
Foi essa situação que Cheng Yin encontrou ao adentrar o quarto de hotel. Um jovem cantor abraçado a sua guitarra enquanto dormia. Parecia um anjo quando dorme.
O homem louro se aproximou do sofá e balançou-o pelos ombros.
— Ling Shan, acorde…
O tom de sua voz era tão gentil que não parecia ser a mesma pessoa que havia surtado alguns dias antes.
Na verdade, Cheng Yin parecia muito cansado e suas olheiras enormes confirmavam tal fato. Mas também, o fedor do álcool misturado ao tabaco transgredia essa imagem de cansaço.
O dorminhoco no sofá se assustou ao notar uma figura estranha. A guitarra quase caiu no chão se Cheng Yin não tivesse pego a tempo.
— O que faz aqui? — Ling Shan se encolheu, como se tivesse visto seu inimigo mortal.
— Colocando sua sujeira debaixo do tapete. — Respondeu, espalhando-se no sofá. Massageou as têmporas e jogou a cabeça para o lado, olhando Ling Shan.
— Está bêbado?
O louro riu.
— O que acha? — Ele cerrou os dentes. — Passei a noite inteira bebendo com aqueles velhos desgraçados e ainda não deu certo.
Ling Shan segurou seu deboche.
“Podia ter passado o resto da vida.”
— Ainda me dando putas baratas… — A sala ficou em silêncio por algum tempo. — Devia me recompensar Ling Shan. — Falou coquete.
Novamente, era esse tipo de ação rotineira. Aquela que deixou o original obcecado. Eles brigavam, Cheng Yin desaparecia por algum tempo, retornava bêbado com uma postura de um príncipe encantado e coquete. Se Ling Shan estivesse bem humorado, passavam o tempo na cama, mas se não estivessem, era outra briga seguida por abusos.
— Eu senti sua falta, baby.
Cheng Yin tentou se aproximar, mas foi recusado. Ele franziu a testa não percebendo a expressão de nojo e medo em Ling Shan.
— Ainda está chateado pelo outro dia? — Ling Shan se levantou. — Desculpe gege por isso. Estava com ciúmes, não pensava muito bem.
Ling Shan revirou os olhos. Se existia algo nojento, era a pessoa em sua frente. Chateado? Ficar chateado com alguém que queria força-lo? Ling Shan sentia era a mais pura raiva!
— Vá tomar um banho e esfriar sua cabeça, seu desg… — O cantor se interrompeu, tornando-se mais amigável e dedicou um sorriso, num tom sugestivo. — Por que A-Cheng não toma um banho primeiro? Vou logo em seguida…
— Não. Eu o conheço, vai escapar de mim.
O cantor respirou profundamente, tentando acalmar seu corpo trêmulo.
— Você. Vem comigo… vamos fazer as pazes… — O empresário se levantou e se aproximou.
“Sonhe, seu vagabundo!”
Enquanto Cheng Yin se aproximava, Ling Shan dava um passo para trás. Infelizmente, havia uma parede no caminho e ele ficou preso entre ela e seu inimigo.
— Era você quem pedia… todas as vezes… — O olhar provocativo.
Encontrando os olhos de Cheng Yin, a única sensação que tinha era pura aversão. Cada neutrino* de seu corpo repelia esse homem, eles eram dois polos negativos.
— Afaste-se, Cheng Yin. — Pediu educadamente.
— Deixe seu gege amá-lo. — Sussurrou no ouvido enquanto o pegou pela cintura.
A mesma sensação de desespero daquele dia se apossou dele. Ele fechou os olhos, paralisado. Não queria enxergar, nem escutar. Colocou as mãos no peito do outro, tentando empurrá-lo, mas não tinha forças.
Cheng Yin aproveitou esse momento para beijá-lo. Não foi como antes, embora soubesse que ele tinha sido um total verme, até aquele momento não sentia nada, mas depois…
— Me solta. — Deu um empurrão de leve e aproveitou para fugir.
— Porra, Ling Shan… volta aqui…
Nesse ponto, ele já estava na varanda, com a porta trancada por fora.
— Cheng Yin, vá tomar um banho. — Falou com confiança. — Precisamos falar de trabalho.
— Mais trabalho? — Estalou a língua. — Não quero falar de trabalho… Abra essa porta… — Encostou seu corpo contra a porta. — Eu quero você… Eu te amo.
— É um assunto sério. — Tentou manter a confiança, mas sua voz tremeu.
Cheng Yin fez beicinho.
— Tudo bem. — E saiu resmungando.
O homem bêbado saiu caminhando para o banheiro. Assim que a porta se fechou, Ling Shan também saiu da varanda.
O cantor abriu o frigobar e assim que virou, se deparou com uma cena familiar. Um garoto chorando, exausto, confuso e desesperado. Ele balançou a cabeça se desvencilhando dessas memórias.
— Vai acabar logo.
Pouco depois, ele recebeu um arquivo para aprovação, a equipe de relações públicas contratada pela LS Entertainment, com a nota de esclarecimento acerca das acusações de uso e até mesmo tráfico de drogas.
O segredo aberto, não era mais um segredo e a resposta ao público foi imparcial e verdadeira, mostrando a realidade do seu ídolo. As provas espalhadas na internet eram verdadeiras e irrefutáveis, tornando impossível contornar a situação de maneira calma.
O público em geral, mas principalmente os fãs, ficaram chocados e assustados com tal notícia. A confirmação vinda da própria pessoa é algo surpreendente. Ele também havia gravado um vídeo curto, expondo suas palavras e pedido desculpas por tudo e trazendo a notícia que já estava em tratamento.
O que já era agitado, tornou-se uma confusão tão grande que, mesmo duas semanas após o ocorrido haviam muitas pessoas discutindo em fóruns e redes sociais. E assim como havia muitos haters, surgiram muitas mensagens e correntes de apoio.
Agora restava esperar os resultados de tudo isso.
Por outro lado, trazendo-lhe boa sorte, assim que saiu do banho, Cheng Yin foi chamado pelo patriarca Ling até a casa principal. Ling Mei estava doente e, devido a gravidez, era um grande risco. O quark Cheng Yin precisou trabalhar em casa.
Pela primeira vez, desde que renasceu, conseguiu dormir em paz.
Ling Shan estava no estúdio desde o os primórdios da manhã. No momento, ele aguardava Zhuo Xia, que havia estourado no último verão. Sua voz conseguia alcançar alguns tons tão altos quanto cantoras estrangeiras e tenores. Mas, sua potência vocal era completamente diferente de sua aparência fofa e virtuosa.
Ao seu lado, sentado no sofá, residia a pessoa que pessoalmente mais detestava nesse mundo. Ele falava no telefone com a esposa.
— Mei Mei, eu não posso voltar para casa agora. Estou no meio de algo muito importante. — Cheng Yin tentou explicar.
[Marido, estou com tanta vontade de comer morangos.] Seu tom meloso e choroso era bastante irritante para quem quer que a escutasse. [Eu realmente não posso esperar… Wuwuwu…[2]
— Eu vou pedir ao motorista que os leve para Mei Mei. Não posso sair do estúdio agora.
[Mas eu quero que você traga!]
A mimada Ling Mei se enfureceu. Seu grande marido revirou os olhos, cansado.
— Ling Mei, vou pedir ao motorista que os leve. Se quiser comer, coma! Se não quiser, apenas jogue fora! Eu preciso trabalhar! Estou desligando.
Cheng Yin inclinou o tronco para frente, com os cotovelos sobre o joelho.
[É sempre assim! Sempre escolhendo A-Shan! Você…! Wuwuwu!]
— Estou desligando. — Respondeu firme e se levantou indo até mesa de chá. — Mais tarde, conversamos. — Massageou entre as sobrancelhas.
— Sua esposa é feroz! — O produtor brincou.
O homem louro riu.
— Um pouquinho, mas temos que controlá-las, não é mesmo?
— Mulheres… elas são assim mesmo…
Então, tratando Ling Shan como o ar, iniciaram uma conversa irritante sobre mulheres terem o dever de serem submissas. Não querendo ser conivente com aquilo, ele fez uma nota mental para levar aquele produtor ao RH. Sentia-se incomodado o suficiente para ficar enjoado.
Ele colocou os fones de ouvido e encostou-se na parede do corredor, acendendo um cigarro. Fechou os olhos contemplando a própria fraqueza e soltou um anel de fumaça, pensando que talvez fosse realmente um lixo, assim como seu pai disse uma vez antes de desaparecer e abandoná-los.
— Eu, Lin Tan, não posso aceitar um filho anormal e drogado em minha casa! Isso não é melhor que lixo!
Ele riu de raiva.
“Velho desgraçado!”
— Fica muito sexy assim… — Uma voz baixa e rouca sussurrou em seu ouvido.
Imediatamente, reconheceu o dono desse barítono e sentiu suas pernas vacilarem.
— Um verdadeiro cafajeste. — O riso de raiva desapareceu e ele olhou para o dono do barítono, completamente arrepiado. — Yang Ge, o que faz por aqui?
Ele estava com um terno preto risca de giz e com seus típicos óculos de aros dourados. Seu corpo meio encostado na parede, com braços e pernas cruzados.
— Vim entregar um convite para Vossa Excelência. — Olhou para os lábios de Ling Shan, em seguida retirando-os para suas írises escuras.
Ling Shan não perdeu o movimento nada discreto de Zhuo Yang.
— Convite? — Ling Shan ficou curioso.
— Sim. — Ele se aproximou. — Assinar nosso contrato na minha cama.
Sem esperar por isso, o cantor quase engasgou. Ele virou o rosto, envergonhado.
— Então você pode ser fofo também… — O mais velho riu. — Embora o convite estará sempre aberto, só vim trazer minha irmã e olhar para o seu rosto bonito.
Ling Shan, ainda envergonhado não ousou olhar para o cafajeste, então ele continuou:
— Como tem passado? Não consegui contatá-lo depois do nosso encontro, estive ocupado esses dias.
— Estou péssimo, mas lidando bem.
— Bem? — Apontou para o cigarro.
— Dos males, preferi ficar na legalidade. — Ele inspirou profundamente, soltando o ar logo em seguida. — Estou tentando me convencer disso.
O corredor ficou em silêncio. E de repente, o cantor se viu preso entre a parede e Zhuo Yang.
— Meu plano inicial era somente olhar, mas de repente senti vontade de beijar. Não é estranho? — Deu um sorriso ladino.
— Muito estranho…
Zhuo Yang estava tão próximo dele que poderia sentir sua respiração. Até mesmo notar uma pequena pinta na pálpebra móvel sobre aqueles olhos verdes magníficos.
E, embora parecesse calmo por fora, Ling Shan sentia que seu coração poderia escapar a qualquer instante. Estava nervoso com a proximidade, mas essa pessoa não era Cheng Yin. Seu problema precisava ser apenas Cheng Yin. Ele mordeu o lábio inferior.
Merda! Ele estava um pouco animado! Um verdadeiro kabedon!
— Pequeno Shan!
E atmosfera sutil se desfez quando o produtor abriu a porta da sala de gravações.
Zhuo Yang se afastou por um momento, escondendo seu rosto.
— Oh, desculpe atrapalhar. Eu…
— Tudo bem Lao[3] Li. — O cantor respondeu. — Já estava voltando.
— Vou aguardá-lo. — O produtor retornou com um sorrisinho no rosto.
Assim que a porta bateu, Ling Shan sentiu lábios quentes caírem contra os seus, trazendo uma sensação de perigo.
— Abra mais a boca…
O cantor se sentiu ameaçado por aquele par de olhos verdes, profundos, como se eles pudessem arrancar a força toda sua resistência. Porém, ainda ameaçado, não resistiu. Não queria resistir.
Quando as paredes internas de sua boca pareciam estar sendo devastadas, passou os braços em torno do pescoço do outro, que se aproximou mais, colando seu corpo ao dele.
Ling Shan, esperava rejeitar o toque de outro homem depois do ocorrido, mas ele parecia derreter com a proximidade dele. O que parecia muito irracional, já que eles se encontraram somente duas vezes.
Enfim, que seja!
E à medida que o beijo se aprofundava, percebeu que as mãos de Zhuo Yang estavam por debaixo de sua camisa apertando todo tipo de lugar.
Mas, ficou alerta quando sua audição capturou o barulho de uma maçaneta se mexer. Ele tentou afastar o cafajeste em sua frente, mas seus braços perderam força. Só conseguiu o que queria, no momento em que seu peito foi beliscado e soltou um gemido involuntário.
— Não sabe o quão bonito está agora. — O cafajeste sussurrou ao seu ouvido.
Zhuo Yang mordeu o lóbulo de sua orelha e traçou uma linha de beijos até chegar em seus lábios, lhe deu um selinho e mordeu suavemente seu lábio inferior puxando-os levemente e devagar.
Assim que se separou, sua respiração estava irregular.
— Respire devagar. Vá com calma. — Ele acariciou a bochecha de Ling Shan. — Quando está livre?
— Hoje à noite. — Respondeu ofegante.
— Vou ligar, atenda.
Nesse ponto, a porta da sala de gravações foi aberta novamente. Dessa vez foi Cheng Yin e ele encontrou um Ling Shan totalmente desconexo. Suas roupas desalinhadas, cabelos bagunçados e meio aéreo.
Ling Shan só voltou a si mesmo, quando estava dentro da sala de gravações, com uma jovem fofa o cumprimentando.
— glossário —
Sassaeng: O termo é utilizado para se referir aos fãs com uma enorme obsessão por um artista.
Neutrino: Trata-se de partículas subatômicas de massa infinitesimal e carga elétrica nula. Depois dos fótons, eles são o tipo de partícula mais abundante no universo. https://pt.wikipedia.org/wiki/Neutrino
Wuwuwu: onomatopeia para barulho de choro.
Lao: honorífico utilizado para se referir a idosos.
Quark: menor partícula do universo. É composto por quark todos os elétrons, nêutrons e átomos de prótons, cada um dos quais foi formado 13 bilhões de anos atrás 7 imediatamente após o Big Bang.